Dificilmente não passamos dificuldade. Me sinto drogada sob o efeito de algo deveras pesado. O cheiro doce da lembrança abre agora espaço para um gosto amargo na minha boca. A brisa leve me toca como as mãos ágeis que outrora me estimulavam a ser feliz. 
O sorriso morno e amarelo, falso, me ajuda a despistar o triste fim que almejo. Jovem, bela e só. Sozinha em minha companhia e em meus próprios pensamentos assombrosos. A angustiante sensação do não saber assola cada passo que dou em qualquer direção.

Olho em frente, inspiro e logo expiro. Uma lufada de ar gélido me toca a ponta do nariz, estremeço com uma sensação eminente de que enquanto parada, perco algo que poderia acontecer. Meu destino, está em minhas mãos agora trêmulas com seus dedos esguios, finos e tão estúpidos. O traço de vida são as unhas pintadas de vermelho brilhoso... Brilho que parece fosco quando me lembro que mesmo o opaco azul descascado, parecia brilhar na ponta de meus dedos quando você os segurava.

Estúpidos e profundos pensamentos! Ouço dizerem que almas gêmeas sentem sensações e que, quanto mais se pensa em alguém mais este alguém está a pensar em você. Ouso dizer que há alguém pensando em mim a todo instante e que se lembra, perfeitamente, de quando me conheceu. Penso ser impossível, uma alma vibrar sozinha quando em um lugar não se encontra apenas uma, mas duas pessoas. 

Os reflexos mentiram? Ao olhar nos olhos de quem tanto me sentiu, pude enxergar o infinito. O infinito me segurou em seus braços de maneira tão aconchegante que soou como despedida, um medo iminente de perder. Ora, mas perder o que? Estava eu aparentando estar assustada? Acuada? Perdida? Não, ao contrário disto! Repousei minha cabeça rodeada por pensamentos pesados em seu colo e você, suportou! Pensando hoje vejo o quanto sou estúpida quanto aos meus sentimentos... Um passo em falso e tudo estava perdido sem ao menos eu ter uma chance de mudar e caminhar na direção certa. Mas que direção é essa?

O passado é superado com o tempo, isto é uma recíproca verdadeira. Mas e quando o passado resolve espreitar-te a cada dia? Maldito dia em que ouvi aquelas mesquinhas palavras "te amo". O som ainda ecoa no meu ouvido e nesta noite, na calada e na calma noite, o sussurro me soa como um grito. Um verdadeiro estardalhaço. A rua parece calma mas ainda possui lembranças de quando sentados na calçada, pudemos falar sobre tudo e sobre nada. Mesmo com o frio, logo cedeu seu casaco para me aquecer e lá estava eu: perdidamente apaixonada! 

Ah, os pensamentos... São tão traiçoeiros que me fizeram ousar pensar que necessitava de um rótulo, quando na verdade já tinha o meu voto. Os olhos não mentem e era para mim que aquele homem olhava com orgulho, carinho... Estava determinado. Existe prova de companheirismo maior do que alguém lhe proteger? E não, não estou pensando em gestos enormes de cavalheirismo... Mas coisas pequenas que quando eu falo, me olham como se eu estivesse maluca!
 
Eu posso afirmar com convicção que me apaixonei por pequenos gestos, pequenas palavras e atitudes significativas. De nada tem a ver com a minha imaginação ou com uma sutil manipulação do meu cérebro. Foi real! Eu senti! Eu vivi! E ainda acredito numa possibilidade de ao menos reencontrar novamente este homem por entre os caminhos da vida.
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